Lista T&NB: Por que os festivais precisam adotar?

As listas T&B incluem as pessoas trans e não-binárias nos festivais. Se não conhece a iniciativa ou não entende a importância, te contamos tudo!

No primeiro semestre de 2024, Iná Cholodoski e Macaia Ferro produziram o relatório Listas Trans – Um Panorama dos Festivais Brasileiros de 2023, que traz dados e insights sobre a política de inclusão de pessoas trans e não-binárias dentro dos espaços de entretenimento, conhecida como Lista T&NB (Trans e Não-Binária). 

O levantamento surgiu da vontade de falar mais sobre essa pauta que segundo Iná Cholodoski, pesquisadora e douranta em Sociologia, é muito importante já que: “para viver uma vida plena e saudável, não precisamos debater apenas sobre direitos básicos para sobrevivência como acesso à saúde, alimentação e moradia. Cultura e entretenimento são essenciais para a manutenção do nosso corpo, mente e espírito.”

Cada vez mais espaços culturais querem carregar e exibir o título de diversidade e inclusão, mas precisamos refletir o quão fundo esses espaços estão indo para se dizer diverso. 

Ingressos sociais e áreas exclusivas para PCDs são alguns exemplos de ações que tornam os eventos inclusivos para o público. Nos palcos, a pauta de equidade de gênero está cada vez mais presente, visto que a maioria dos festivais brasileiros ainda tem um line up majoritariamente masculino. 

Quando olhamos para a população trans nos palcos, o cenário não é dos melhores. Segundo o Mapa dos Festivais: Panorama 2023 apenas 17% dos lines ups do ano passado foram formados por pessoas trans e não binárias.

Embora esteja acontecendo um aumento significativo desses corpos ocupando os palcos, os festivais ainda têm dificuldades em colocar artistas trans nos seus line ups.

Em diversos line ups, vemos artistas como Majur, Liniker, Jup do Bairro e a dupla de funk paulista Irmãs de Pau aparecendo em letras grandes como headliners. Mas enquanto suas participações dentro do universo da música se expandem, o mesmo não pode ser dito da população trans que frequenta estes espaços”, destaca o relatório Lista Trans – Um Panorama dos Festivais Brasileiros de 2023.

É aí que entra a representatividade: todo mundo precisa se enxergar nos espaços onde a sociedade se reflete, caso contrário é como ter sua existência apagada.

Nesse cenário, Iná e Macaia destacam a necessidade urgente de criar políticas para garantir a presença e inclusão de pessoas trans na sociedade.

Vamos para o início, lá em 2017, quando o festival recifense No Ar Coquetel Molotov lançou a primeira lista trans em um grande evento musical. As listas já rolavam em diversas festas no Recife, com a iniciativa de Ana Giselle, conhecida como TransAlien. Assim, ela foi a pioneira da lista trans e não-binária no Brasil. 

“A população trans não têm o direito de ter acesso ao lazer e à cultura. Sendo assim, a lista é uma medida de inserção e não de isenção, não é sobre privilégios, é sobre restituição.” – TransAlien

Como é de se imaginar, as inscrições nas listas trans são altas e a disponibilidade de ingressos é baixa. Dessa forma, existem critérios de seleção que normalmente são seguidos pelas listas:

Território de origem das pessoas candidatas 

(normalmente sendo priorizadas pessoas que residam na mesma Cidade/Estado do evento)

• Perfil racial 

(o Afropunk prioriza pessoas trans e não binárias autodeclaradas pretas e pardas, por exemplo)

A não possibilidade de ter estado anteriormente em alguma edição do evento.

Além destes critérios, ainda existe um processo normalmente demorado de avaliação das pessoas candidatas. Tal fator é necessário não somente pelos critérios acima sinalizados, mas também pela quantidade de pessoas cisgêneras sem noção social que realizam o processo de transfake para poder adquirir o ingresso”, conta Iná que também é realizadora e curadora das listas trans. Ou seja, pessoas cis preenchem os formulários criando ou adaptando seus nomes para garantir os ingressos de forma gratuita. 

Com os altos valores de ingressos, as listas são uma medida de inclusão para pessoas trans e não binárias que, muitas vezes, têm dificuldade em se inserir no mercado de trabalho e garantir um emprego formal com renda fixa.

Segundo a matéria da Meiuca, um levantamento da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra) aponta que 90% da população trans e travesti recorre à prostituição para sobreviver. Muitas dessas pessoas são rejeitadas ou expulsas de casa e, sem opções, acabam na informalidade, longe da educação e das chances de qualificação e emprego. 

Algumas horas de lazer em um show ou festival, podendo enxergar mais de si em outras pessoas no espaço, nos palcos e em outras áreas da produção pode ser um suspiro de esperança e tranquilidade. Uma ação que pode parecer pouco, mas de pouquinho em pouquinho, transforma. 

Promover acesso é não apenas pensar na entrada de indivíduos nos espaços, mas também em sua experiência e permanência. Afinal, são inúmeras as barreiras social e culturalmente criadas para que pessoas trans e travestis, pessoas racializadas e pessoas com deficiência não se sintam contempladas, confortáveis e pertencentes aos espaços”, aponta o relatório da Lista Trans na conclusão. 

  • A sensibilidade na comunicação e recepção com o público é fundamental para criar uma experiência acolhedora, então é essencial o uso da linguagem inclusiva. Além disso, é preciso ter profissionais com capacitação e preparação certa para lidar com necessidades e demandas específicas de pessoas trans e nb.
  • A implementação de banheiros sem gênero é uma outra demanda significativa nas políticas de acesso para pessoas trans. A arquitetura e a logística dos espaços também influenciam na inclusão ou exclusão, impactando como as pessoas acessam lugares e serviços.
  • Para garantir acolhimento e pertencimento, é importante que as pessoas se identifiquem com quem compartilha experiências parecidas. Ter pessoas trans e não-binárias não só nos palcos, mas também na produção e logística do festival, faz toda a diferença para criar uma experiência realmente acolhedora.

Por fim, respondendo a pergunta que fizemos no título de forma direta: precisamos incluir. Principalmente festivais que querem levantar a bandeira da diversidade. É preciso se questionar se realmente está todo mundo incluso ou se são apenas políticas rasas para garantir um bom slogan. 

A iniciativa de listas T&NB não só é um benefício para as pessoas trans e não-binárias, como também pode auxiliar na expansão de eventos como festivais e shows. Quanto mais pessoas tiverem acesso, melhor para todes. 

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